Idade Média, ano 1421 d.C., Valença, Espanha.
-
Queimem o herege! – a voz sinistra do Frade Torquemada ressoou naquela praça de
execuções como se fosse a voz do próprio Satã.
O jovem
amarrado na estaca, bem no centro da praça, ao sentir as chamas começarem a
devorar seu corpo, clamou bem alto:
- Cidadãos de Valença! Nada podemos
contra a verdade! A mentira está com os dias contados e em breve a verdade
triunfará! Hoje estão fechando minha boca, mas o Deus dos Céus abrirá os olhos
e a boca de muita gente para proclamarem a verdade! Chegará o dia em que não
será mais proibido conhecer a verdade, e o verdadeiro conhecimento de Deus será
proclamado no mundo todo, e ninguém conseguirá impedir! Chegará a hora em que
qualquer pessoa poderá crer no que quiser, estudar o que quiser, questionar o que
quiser, mas não será mais queimado por isso! SIGAM JESUS E SUA LUZ, POIS TODO O
RESTO NÃO ADIANTA NADA!
Após estas
palavras, a cabeça do jovem inclinou-se para a frente, sem vida. No meio da
multidão, uma moça chorava. Ela tentou se aproximar um pouco mais do centro da
praça. Sem querer, deixou cair um objeto metálico, um medalhão. Alguém percebeu
isto e, após apanhá-lo, gritou para a multidão:
- Agarrem essa moça! Ela é um deles!
A jovem
olhou para trás e correu. Por estar usando uma grande capa e carregando uma
espécie de baú, não demorou a tropeçar e a cair. Foi rapidamente apanhada e
levada perante Torquemada, o terrível Inquisidor Geral. O pequeno baú foi
aberto pelos soldados comandados por Torquemada. O odiado Inquisidor apanhou um
livrinho escrito em latim e um livro maior, uma Bíblia. Ele apertou o pequeno
livrinho como se estivesse com toda a raiva do mundo.
- Vejam – disse ele diante dos
demais inquisidores – vejam a prova da apostasia. Não precisamos gastar tempo
em julgamento. Não é preciso provar mais nada. Vejam esses livros malditos –
Torquemada mostrou radiante a Bíblia e o misterioso livrinho cujo título era: O
ROSTO DA PROSTITUTA BABILÔNICA – O PLANO DOS MESTRES ELEVADOS. Ele – como que
possesso por milhares de demônios - passou a gritar:
- Ela é uma serva de Satanás!
Queimem-na sem misericórdia! Queimem-na!
E
a assustada moça foi levada para ser executada na fogueira.
Igarapé Grande, Maranhão, Brasil, 1987, cinco séculos depois.
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Igarapé Grande, Maranhão, Brasil, 1987, cinco séculos depois.
Miguel, um jovem estudante de 16 anos estava tenso, muito tenso. Ele se achava diante de uma garota, cujo encontro aguardou durante 6 anos. Ele adorava enigmas e seu passatempo era colecionar charadas e quebra-cabeças. Mas agora estava diante do maior enigma de sua vida: o enigma do amor.
Aquela maravilhosa
sensação de sentir o coração bater mais forte, a respiração ficar alterada e as
mãos suarem, pelo simples fato de se olhar para uma pessoa... Aquela sensação
inexplicável que faz você pensar dia e noite numa pessoa como se ela fosse a pessoa
mais especial do mundo.
Seis anos atrás Miguel
caminhava distraidamente pelas ruas da pequena cidade onde vivia. Era uma manhã
de muito vento e folhas secas criando paisagens inimagináveis. De repente,
alguém numa bicicleta. Uma menina. Uma garota de olhos verdes cheios de
mistérios. Quando os olhos de Miguel se cruzaram com aqueles olhos verdes que
pareciam encantados, seu coração disparou de uma forma que dificilmente um
poeta seria capaz de descrever.
E ela sumiu na esquina
mais próxima. Mas parece que a alma dela acabava de ficar aprisionada dentro do
coração de um adolescente que sempre gostou de enigmas, e agora havia
encontrado a maior charada de sua vida.
Durante os próximos seis
anos, Miguel haveria de amar uma sombra, uma garota invisível. Apesar de
morarem numa cidade pequena, onde todos se conhecem e se cruzam todos os dias,
o adolescente caçador de enigmas e a garota dos olhos encantados viveriam seis
longos anos sem ao menos um ver a sombra do outro.
Nunca
antes ele se impressionara tanto com alguém, mas a partir daquele dia, passara
a pensar nela, dia e noite. Não conseguia esquecer aqueles olhos misteriosos,
belos, perturbadores. Queria entender o porque. Seria o tal amor à primeira
vista? Não, não devia ser simplesmente isso. Durante seis anos, morando na
mesma pequena cidade, nunca se encontraram, mas depois de vê-la não conseguia
mais esquecê-la.
Agora, seis
anos depois, eles estavam frente a frente. O coração dele batia forte,
parecendo querer saltar fora. Ela simplesmente sorria, conversava com ele de
forma descontraída, sem jamais sonhar que estava diante de alguém obcecado por
ela.
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Cairo,
Egito. 1999.
Numa
Biblioteca especializada em livros orientais e medievais, Moyra Jenny Stanley –
aproveitando seus poucos dias de férias – fazia umas pesquisas pessoais. Ela
era uma inteligente jornalista americana, cujo currículo incluía até uma
passagem pela CIA (Agência de Inteligência Americana), pelo departamento de
decodificação e tradução de textos misteriosos – muitos deles usados nos
serviços de espionagem estrangeira. Ela tinha uns laços de amizade com certos
brasileiros, um grupo de pesquisadores conhecidos como Grupo7.
Ela estava
na seção de literatura persa. Procurava pistas sobre os misteriosos magos que
vieram do Oriente conhecer o menino Jesus. Recentemente participou de uma
conferência sobre os grandes mistérios da Humanidade (organizada pelo Grupo7 em
Porto Alegre), e lá foi levantada a questão:
“COMO OS MAGOS SOUBERAM O TEMPO EXATO DO
NASCIMENTO DE JESUS, E TINHAM TANTA CERTEZA QUE EMPREENDERAM AQUELA LONGA
VIAGEM CHEIA DE RISCOS E CONTRATEMPOS?”
A tradição
sempre ensinou que eles viram a estrela no Oriente e, guiados por essa estrela,
chegaram até Belém. Mas, na opinião de alguns “SETES”, essa história estava mal
contada.
Ela
lembrava das palavras de Diego a respeito:
- Observem o que diz o texto bíblico
– falava Diego Draconne, um jovem moreno, alto, bigode fino, professor de
Física, diante de uma grande mesa redonda, com cerca de 40 participantes – Aqui
em Mateus, capítulo 2, lemos:
“Tendo, pois,
nascido Jesus em Belém da Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que vieram do
oriente a Jerusalém uns magos que perguntavam: Onde está aquele que é nascido
rei dos judeus? pois do oriente vimos a sua estrela e viemos adorá-lo.”
- Vejam com cuidado – continuou
Diego – aqui não diz que eram “reis magos”, mas simplesmente “magos”. Também
não diz o número deles, que a tradição afirma ser três. Quem eram eles? Eles
vieram do oriente, e foi lá no oriente que eles viram a estrela. Mas como
interpretaram aquela estrela diferente com o nascimento do Rei dos judeus? E
como sabiam com tanta certeza que seria o Rei dos judeus?
- Ora, as profecias – observou
Vanessa, uma jovem de cabelos curtos, castanhos e lisos – os profetas de Israel
sempre falaram da vinda do Salvador, o Rei dos judeus. Há cerca de 300
profecias somente sobre a primeira vinda de Cristo.
- Sim, é verdade – falou Diego
novamente – sabemos que esses magos eram provavelmente da Pérsia ou da Índia.
Eles pertenciam a uma classe de estudiosos que tinham acesso a muitos
documentos antigos – principalmente pergaminhos egípcios, babilônicos e
hebraicos. Certamente eles tiveram acesso aos escritos de Daniel, já que Daniel
foi um importante ministro tanto da Babilônia, como da Pérsia. Há muitos
manuscritos persas sobre Daniel – a grande maioria recheada de lendas e
histórias sem sentido.
- Então, com certeza eles estudavam
minuciosamente as profecias hebraicas sobre o Messias – disse Melissa, uma
morena alta – e assim sabiam até onde Jesus haveria de nascer, pois o profeta
Miquéias foi quem disse: “Mas tu, Belém Efrata, posto que pequena para estar
entre os milhares de Judá, de ti é que me sairá aquele que há de reinar em
Israel, e cujas saídas são desde os tempos antigos, desde os dias da
eternidade”.
- É isso aí – falou Diego – e o que
estou querendo entender é como os magos souberam o tempo exato do nascimento de
Jesus. A estrela simplesmente apareceu no tempo exato do nascimento de Cristo e
os guiou até Belém, mas ao que tudo indica, eles já tinham certeza que aquele
sinal no céu tinha a ver com o nascimento do Rei dos judeus.
Enquanto
pensava nisso, Moyra Stanley ia olhando os títulos dos empoeirados livros. E,
de repente, um título chamou sua atenção: A ORDEM DOS “SETE”. Era um livro
muito antigo, escrito em latim. A linda jornalista ficou cada vez mais
excitada. Ordem dos “SETE”? Então haveria uma sociedade secreta chamada de
“SETE”? Seria uma sociedade ocultista? O pessoal do Grupo7 iria cair da cadeira
quando soubesse daquilo. Rapidamente ela começou a folhear o livro, com todo
cuidado, pois as páginas davam claros sinais de que tinham vários anos de
existência. Ela começou a ler:
*******
Estamos no
ano 753 da Fundação de Roma. Os habitantes de Jerusalém estão inquietos. Uma
grande caravana de pessoas de vestes estranhas está atravessando a cidade. Uns
homens de estranhos turbantes perguntam insistentemente:
- Onde está o
recém-nascido Rei dos judeus? Estamos aqui para adorá-lo.
Rei dos
judeus? As pessoas estão confusas. Quem estava reinando por ali era Herodes, e
ele não era nenhum recém-nascido.
Como era
de se esperar, essa história chegou rapidamente aos ouvidos do rei Herodes.
- Um Rei dos judeus? – perguntava
ele, olhando ao redor, diante de todos os sacerdotes e escribas – que outro rei
é esse?
Então os
escribas lhe explicaram que havia a tradição da vinda de um grande Rei, um
Ungido (Messias, em hebraico), para libertar os judeus da escravidão dos seus
inimigos.
- Mas onde nascerá esse Messias? –
Perguntou Herodes, visivelmente perturbado.
- Em Belém da Judéia, majestade –
respondeu um ancião – pois está escrito no profeta Miquéias:
“Mas tu,
Belém Efrata, posto que pequena para estar entre os milhares de Judá, de ti é
que me sairá aquele que há de reinar em Israel, e cujas saídas são desde os
tempos antigos, desde os dias da eternidade”.
- Mas como podemos saber se ele
nasceu agora?
Os anciãos
ficaram calados.
“Então
Herodes chamou secretamente os magos, e deles inquiriu com precisão acerca do
tempo em que a estrela aparecera; e enviando-os a Belém, disse-lhes: Ide, e
perguntai diligentemente pelo menino; e, quando o achardes, participai-mo, para
que também eu vá e o adore. Tendo eles, pois, ouvido o rei, partiram; e eis que
a estrela que tinham visto quando no oriente ia adiante deles, até que,
chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino. Ao verem eles a
estrela, regozijaram-se com grande alegria. E entrando na casa, viram o menino
com Maria sua mãe e, prostrando-se, o adoraram; e abrindo os seus tesouros,
ofertaram-lhe dádivas: ouro incenso e mirra. Ora, sendo por divina revelação
avisados em sonhos para não voltarem a Herodes, regressaram à sua terra por
outro caminho.” (Mateus 2.7-12).
Enquanto
os magos se afastavam de Jerusalém, um cavaleiro aproximou-se velozmente:
- Eu gostaria de fazer uma pergunta
aos senhores.
Aquele que
parecia o líder do grupo, um ancião parecido com um profeta bíblico,
adiantou-se e também perguntou:
- Quem é você, jovem? Algum dos
asseclas de Herodes? – Enquanto perguntava, o ancião fez aceno a três homens,
que prontamente tocaram em suas espadas.
- Não, não se preocupem – o jovem
olhou temente para as reluzentes espadas ainda na bainha dos protetores dos
magos – eu não tenho nada a ver com Herodes. Sou apenas um pesquisador em busca
da verdade. Eu só gostaria de saber como os senhores souberam o tempo exato do
nascimento do Ungido. – o jovem retirou alguma coisa da bolsa e entregou ao
ancião.
- O medalhão da Ordem dos “SETE”? –
admirou-se o ancião devolvendo o objeto.
- Então os senhores conhecem isso
também?
- Sim, pois também estudamos os
escritos do sábio Daniel.
- Então vocês são mesmo da Pérsia?
- Exato. Mas alguns aqui vieram da
Índia e outras regiões do extremo Oriente.
- Então, minha primeira pergunta já
foi respondida. Vocês estudaram a profecia das 70 semanas de Daniel, certo? É
lá que revela o tempo do nascimento do Ungido. Não imaginei que pessoas tão
distantes de Israel estudassem nossas profecias.
- Mas desde quando você pertence a
Ordem dos “SETE”? - perguntou o ancião.
- Minha família está muito ligada a
esse grupo de pesquisadores. Meu avô sempre nos ensinou que um dos antepassados
dele conheceu o sábio Daniel pessoalmente, e, mais tarde, organizou um arquivo
sobre as profecias judaicas. Ao lado de outros amigos estudiosos dos mistérios
proféticos fundou então essa Ordem de Pesquisadores chamada SETES.
- Extraordinário – Disse o ancião,
mostrando em seguida um outro medalhão semelhante ao primeiro - Ainda há
pesquisadores “SETES” nas bandas do Oriente. Deus te abençoe, menino.
E, antes
que o surpreso jovem pudesse balbuciar qualquer palavra, os estranhos homens
partiram.
No
decorrer de toda a história do Cristianismo, as sociedades secretas prepararam
o caminho para a vinda do Anticristo, mas uns homens misteriosos pertencentes a
Ordem dos “SETE” sempre conseguiam desmascarar os segredos dessas sociedades,
expondo-os em público. E por isso eles foram duramente perseguidos. Muitos
foram executados, acusados injustamente de praticar a feitiçaria. Mas eram
apenas “detetives espirituais”, cuja missão principal era registrar os fatos
verdadeiros da História e descobrir os planos das sociedades secretas, pois
tinham grande convicção de que seriam por meio delas que o Anticristo alcançaria
o poder.
O primeiro
a sabotar os planos das sociedades secretas ocultistas foi Sem, o filho de Noé.
Ele combateu Ninrod, o fundador da feitiçaria babilônica. Mais tarde, em
Babilônia, Abraão foi despertado para a verdade e lutou contra o ocultismo babilônico.
Muitos anos depois o povo de Israel foi levado para o cativeiro justamente para
a terra onde tinha nascido a feitiçaria – Babilônia. Mas quatro jovens (Daniel,
Misael, Hananias e Azarias) foram destaque na Babilônia, por decifrarem toda
sorte de enigmas dos céus e da terra. E eles foram inspiradores de uma Ordem
que pesquisava a verdade por trás dos acontecimentos e combatia a feitiçaria em
suas variadas formas e disfarces, a Ordem dos “SETE”, os homens que sabiam
demais – e eram ameaçados de morte dia e noite pelos membros das sociedades
secretas ocultistas.
*******
Moyra
Stanley estava fascinada. As próximas páginas do livro revelador mostravam
todos os eventos importantes da Era Cristã até um certo período da Idade Média,
e citava os nomes das sociedades secretas com seus planos desmascarados pelos
“SETES”. Enquanto folheava o livro, um livrinho de capa vermelha caiu. Ela
abaixou-se rapidamente e gelou ao ler o título: “O ROSTO DA PROSTITUTA
BABILÔNICA – O PLANO DOS MESTRES ELEVADOS”.
Todo o livrinho
estava também escrito em latim. Seu conteúdo era bastante explosivo.
Relacionava passagens bíblicas com eventos históricos e mostrava, numa espécie
de mapa mental um esquema envolvendo religiões e sociedades secretas,
supostamente unidos para dominar o mundo num futuro próximo.
. Quem
poderia ter escrito esses livros, como foram parar numa biblioteca egípcia, e
por que estavam na seção de literatura persa? Enquanto meditava nisso, Moyra
ouviu passos do outro lado da estante. Ela estava numa sala bastante isolada.
Parecia que ninguém dava importância àquela seção de Literatura Persa. Mas
havia mais alguém ali. De repente, aquela sensação de perigo iminente. Coisa
que ela sempre sentiu quando esteve caçando manuscritos antigos em terras pouco
civilizadas. Alguém se aproximava, pisando no chão de maneira estranha.
Subitamente, um homem, com barba como de profeta, surgiu no final do corredor e
aproximou-se a passos lentos em direção à linda jornalista.
- Saia daqui! – disse ele em tom
forte e inquietante – Saia depressa, se tem amor a vida!
- Sair por que? – ela não era do
tipo que se intimidava facilmente. Além do mais, era muito curiosa. Os “SETES”
costumavam dizer que Eva perdia para ela em curiosidade.
- Eles sabem quem você é e o que
está fazendo aqui. O príncipe está para assumir o trono e quem tiver
conhecimento do PLANO DOS MESTRES ELEVADOS deve ser eliminado – disse o ancião.
- De que príncipe você está falando?
– Ela recuou um pouco, enquanto sutilmente escondia o livrinho vermelho na
bolsa.
- O Desolado, a Besta do Mar, o
filho da noite eterna. Ele está na Europa. Está usando o nome de... –
Subitamente o homem emudeceu, mas logo em seguida soltou um grito de dor.
Sangue
saía de seus lábios e ele se ajoelhou, agarrando as mãos de Moyra e balbuciando:
- Saia daqui, moça! Volte para a
América! Avise os “SETES” que ele chegou...
O ancião
caiu no chão, após ter soltado um sinistro grito de dor. Moyra Stanley ainda teve tempo de ouvir o
ancião pronunciar um nome e um endereço. Ela viu cravada nas costas dele uma
adaga com um cabo dourado e uma figura parecida com três serpentes cruzadas.
Então correu para o outro lado, enquanto escutava os passos dos misteriosos
atacantes.
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Igarapé Grande – Brasil, 1987.
Era uma
manhã de abril, uma manhã de muito vento e sol. Por meio de umas circunstâncias
imprevisíveis, Miguel e a misteriosa garota estavam frente a frente. O nome
dela era Keyth Killian.
Numa feliz
coincidência, os dois passaram a estudar no mesmo colégio, na mesma sala, e um
dia se aproximaram, pois teriam que fazer um trabalho escolar em equipe.
De uma
hora para outra eles se tornaram grandes amigos, dividiram emoções, idéias,
criatividade. Miguel achava que estava sonhando. Ela não fazia a mínima idéia
da paixão que ardia no coração dele.
Eles passavam muito tempo juntos. Parecia um sonho. Mas –
como se costuma dizer por aí - eles não haviam nascido um para o outro. Miguel
ainda não sabia, mas Keyth estava noiva. E alguns dias depois, soube pelos
lábios dela.
- Miguel,
eu... eu estou noiva. Me casarei daqui a dois meses. Gostaria que você fosse à
minha festa.
Ele não conseguiu dizer uma palavra, de tão surpreso que
ficou.
- Há algo errado? – pergunta ela, observando a reação
silenciosa de Miguel.
- Não...não.
– Ele não conseguia dizer mais nada. Se antes nunca teve coragem de dizer o
quanto ela era importante para ele, agora era que não diria mesmo.
- Miguel...você
está bem?
O encanto
acabou de uma forma muito súbita. Um encanto que durou 6 meses. A amada dos
sonhos de Miguel tornou-se uma doce ilusão. Ele aguardou 6 anos para viver um
sonho de 6 meses. Que mundo estranho. Estranho? Nada era para se comparar ao
que vinha pela frente. O destino deles iria se cruzar novamente um dia. Mas
seria numa época dramática, cercada de circunstâncias bizarras.
Sem entender a razão de tantas reviravoltas misteriosas,
Miguel mergulhou em uma grande depressão. Mas ele teria ainda mais razões para
se trancar em seu mundo particular, pois algum tempo depois soube que Keyth não
estava bem em seu casamento e que havia se tornado uma pessoa de caráter
totalmente oposto àquele que ele havia imaginado que houvesse nela.
A mente de Miguel enchia-se de porquês. Por que ele foi
conhecê-la justamente quando ela estava noiva? E por que ela mudou de maneira
tão drástica?
Mas o
futuro é mestre em surpresas e reviravoltas. Algum tempo depois e Keyth estaria
novamente sozinha. Uma série de contratempos e insatisfações levou Keyth a se
divorciar. Ela resolveu partir para bem longe. Tentaria começar uma nova vida.
Ela ainda era jovem e bonita. Não teria dificuldade em encontrar um novo amor.
A vida tinha que continuar. Mas ela jamais imaginava os dramáticos
acontecimentos que seu futuro estava reservando.
O passado
devia ficar para trás, devia ser enterrado. Ela agora era uma outra pessoa. Na
verdade, fazia até questão de não ser conhecida mais pelo seu nome verdadeiro.
Para todos os efeitos Keyth Killian morreu.
*******
EM ALGUM LUGAR NA ITÁLIA, NO INICIO DOS ANOS 80...
Aquela congregação cristã estava extasiada,
fascinada e perplexa diante do pregador daquela noite. E não era para menos.
Aquele pregador inspirado tinha somente 6 anos de idade. Seu nome: Luigi
Gianne.
- Hoje eu desejo ler em Gênesis, o
primeiro livro da Bíblia, no capítulo 6 e versículos 12 a 14:
“Viu Deus a terra, e eis que estava
corrompida; porque toda a carne havia corrompido o seu caminho sobre a terra.
Então disse Deus a Noé: O fim de
toda carne é chegado perante mim; porque a terra está cheia da violência dos
homens; eis que os destruirei juntamente com a terra.
Faze para ti uma arca de madeira de
gôfer: farás compartimentos na arca, e a revestirás de betume por dentro e por
fora.”
Durante
cerca de meia hora, o pregador mirim explicou o texto bíblico e relacionou com
o tempo atual, fazendo claras aplicações práticas. Ao final convidou as pessoas
que estavam doentes para virem à frente a fim de receberem a oração da cura.
Rapidamente dezenas de pessoas se levantaram e se
aproximaram do púlpito. Houve um momento de oração, e o pequeno Luigi clamou a
Deus de forma emocionante. Naquele momento, um ancião levantou-se da cadeira de
rodas, onde estivera durante muito tempo, devido a um acidente. Uma senhora,
com um grande tumor na cabeça, começou a pular dizendo que estava curada – e toda
a congregação realmente viu que o tumor desapareceu por completo. Muitos
milagres aconteceram naquela noite, e aquilo era comum sempre que o pequeno
Luigi pregava.
Alguns minutos depois o pequeno pregador deixou o púlpito,
enquanto um murmúrio de admiração se ouvia no meio da congregação. O reverendo
local levantou-se e olhando para o garoto, disse:
- Deus continue te abençoando, Luigi.
Naquele momento, um homem, de aproximadamente uns 35 anos,
levantou-se e saiu, sem cumprimentar ninguém. O porteiro olhou para ele e o
cumprimentou, sem receber resposta. O enigmático homem logo desapareceu na
noite. Mas havia mais uma coisa nele que chamaria a atenção de qualquer pessoa:
ele tinha uma cicatriz na testa, uma espécie de cruz.
Alguns minutos depois a caminho de casa, a mãe do pequeno
pregador é abordada por várias pessoas.
- Você foi privilegiada por Deus, senhora Gianne – dizia
alguém.
- Leonora, por que você não envia Luigi para estudar na
cidade grande? Aqui ele não tem futuro – Perguntou uma senhora, sorridente.
- Senhora Gianne – disse um rapaz que seguia de mãos dadas
com sua noiva – eu e Annete iremos nos casar em breve e queremos muito ter um
filho – ele sorriu e olhou para sua noiva – na verdade, vários. Gostaria muito
que tivéssemos um filho igual a Luigi.
Enquanto eles conversavam, o pequeno Luigi seguia a frente,
ao lado de um grupo de crianças, pulando e brincando, como qualquer criança
normal. Ele parecia não notar que era o alvo da atenção de muita gente, na
verdade de todos os habitantes daquela pequena cidade italiana.
Ao longe outros olhos fitavam o pequeno Luigi. Era o homem
da estranha cicatriz na testa.
*******
Lezia, um
povoado de Verona, norte da Itália, final dos anos 70.
O sol
ainda não tinha nascido, embora a luz da manhã já começasse a espantar as
trevas. Uma multidão enfurecida estava arrastando um casal pelas ruas
empoeiradas daquele miserável povoado. Com gritos histéricos, os habitantes de
Lezia arrastaram o infeliz casal até uma pequena colina fora da cidade.
Ensangüentados e quase desmaiados de tanto sofrimento, Dante e Maria Polina
foram amarrados em duas estacas.
Ao longe
uma criança chorava, embora ninguém a consolasse. Seu nome era Ravena Polina,
filha única do condenado casal. Ela tinha seis anos.
- Por que
estão fazendo isso? Meu Deus, por que estão fazendo isso? – Gritava ela.
Dante e
Maria eram dois jovens camponeses recém-chegados àquele povoado escondido atrás
das montanhas. Eles eram Cristãos, mas possuíam umas idéias estranhas que
causavam espanto aos demais moradores de Lezia, que também eram Cristãos, mas
seguiam um cristianismo misturado com paganismo e superstições. O casal Polina
costumava dar palestras sobre profecias bíblicas e acontecimentos futuros, e
isso começou a incomodar a elite religiosa da região. Dante e Maria eram
bastante simpáticos e conseguiam viver em paz com uma boa parte da comunidade,
embora fossem mal vistos pela outra parte.
A desgraça
começou quando chegou ao povoado Renzo Tasso, um jovem padre jesuíta, enviado
especialmente para desmoralizar Dante e Maria que estavam causando polêmica no
povoado ao tentar abrir os olhos dos filhos de Lezia para certas verdades
fundamentais da Bíblia relacionadas aos acontecimentos futuros.
Renzo não
tardou em arquitetar uma trama diabólica, cujas conseqüências foram
estarrecedoras. Uma jovem virgem foi encontrada morta em circunstâncias
misteriosas. Estava nua, amarrada no chão em forma de X, dentro de um
pentagrama (uma estrela de cinco pontas dentro de um círculo, um poderoso
símbolo da magia negra).
Rapidamente
Renzo espalhou um boato de que os Polina eram os verdadeiros responsáveis.
Arrastando uma boa parte dos habitantes de Lezia, Renzo invadiu a casa dos
Polina e foram encontrados no quarto do infeliz casal as vestes manchadas de
sangue da jovem sacrificada. Como se não bastassem, debaixo da cama dos Polina
foram encontrados muitos livros da alta magia, cheio de símbolos misteriosos e
encantamentos. Tudo bem arquitetado pelo satânico Renzo.
Os
fanáticos habitantes de Lezia não tiveram mais um pingo de dúvidas. Rapidamente
prenderam o assustado casal e o arrastaram pelas ruas durante duas horas, após
um veloz julgamento organizado pelo padre Renzo.
Dante e
Maria Polina, quase desmaiados pelo intenso sofrimento, foram amarrados às duas
estacas e queimados. Enquanto o sol ia nascendo se ouvia duas espécies de
clamores nas ruas de Lezia: Os gritos de dor e angústia do casal Polina e as
palavras fanáticas dos moradores de Lezia, que clamavam:
- Matem-os
em nome de Cristo!
- Que
queimem no fogo do inferno!
- Que
Cristo os amaldiçoem para sempre!
- Vamos
purificar nossa cidade!
- Morte
aos bruxos!
- Cristo é
o nosso Rei! Que Ele acabe com todos os hereges!
- Somos
filhos de Deus! Morte aos filhos de Satanás!
- Nossa
Senhora nos livre do demônio!
A pequena
Ravena corria pelas ruas, chorando desesperada, mas ninguém estava preocupada
com ela. Aliviados os habitantes de Lezia desciam à colina da morte. Naquele
momento, a pequena Ravena chegou ao local da execução, e, desesperada, tentou
correr até as cinzas que ainda fumegavam. Mas foi impedida. Diante de tanto
sofrimento, ela não conseguiu suportar mais e desmaiou.
*******
Igarapé Grande, Brasil. Alguns anos além do ano 2000.
Miguel tinha marcado um encontro. Na
verdade, alguém tinha marcado um encontro com ele. Estava no alto de uma ponte,
observando o por do sol naquele entardecer inquietante. Ele não gostava do
crepúsculo, pois era um momento em que os fantasmas do passado pareciam sair
dos túmulos para lhes trazer tristes recordações. Havia, é claro, muitas
recordações boas – muito boas mesmo – e justamente por isso tornavam-se
tristes.
Enquanto aguardava a chegada de alguém
refletia seriamente no atual estado do mundo. E se de repente o planeta
explodisse e todas as armas nucleares acabassem com tudo e todos e fosse
demonstrado que todas as teses religiosas eram somente fruto da imaginação dos
homens, que não existia Deus, nem céu, nem inferno, nem um Salvador chamado
Jesus, nem vida após a morte nem esperança para ninguém? E se tudo fosse uma
ilusão? O mundo estava muito perigoso. Ameaças terroristas por toda parte,
armas nucleares nas mãos de terroristas, um colapso financeiro iminente,
escândalos cada vez piores envolvendo muitos líderes cristãos, decadência
moral, etc.
Não! Havia provas demais de que o Plano revelado na Bíblia
era mesmo verdade. E se as profecias eram mesmo verdadeiras, um mundo novo
estava chegando. Um mundo sem miséria, terror, pecado e morte. Havia pouco
tempo para falar às pessoas sobre tudo isso.
O sol estava se pondo e o jovem pesquisador começou a
imaginar que seu misterioso amigo não ia mais aparecer. Mas de repente observou
alguém se aproximando da ponte. Era uma moça loira, de cabelos encaracolados.
Parecia ser a pessoa que ele esperava. Ela usava óculos escuros.
- Miguel? – Ela parecia muito tensa.
- Sim – Ele respondeu sem hesitação, apurando a vista,
tentando ver melhor o rosto dela.
A moça abriu uma bolsa vermelha e
apanhou algo brilhante.
- Sinto muito – disse ela de maneira quase robótica.
O rosto de Miguel empalideceu de surpresa.
- Keyth?!!!
Ela apontou-lhe uma pistola de cabo dourado. Apontou e
disparou. Miguel foi atingido no peito e caiu nas escuras águas do rio.
Ela
aproximou-se e olhou para o rio. Então jogou a arma na água e sorriu.
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