terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

CAPÍTULO 1 - O DIA DO ESCORPIÃO


Cidade do Cairo, Egito, 1977.
Dentro de uma enorme sala, de forma oval, ao redor de uma comprida mesa, estavam 18 pessoas, portando capuzes e vestes vermelhas. No centro das vestes, e também sobre a mesa, havia um círculo branco, com o desenho de um escorpião dourado. Em cada capuz havia um círculo branco com um número em vermelho. Sentado numa cadeira diferente das outras, um dos encapuzados (o de número 1) que parecia ser o chefe naquela reunião, levantou-se e disse:
- Meus irmãos, quero dar as boas vindas a todos. Antes de discutirmos o assunto de hoje vamos  ouvir os relatórios. Que se apresente o irmão Número 2.
O encapuzado chamado de Número 2, levantou-se e disse inicialmente:
- O infiel Douglas Malik foi enviado para o reino de Anúbis.

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Anúbis, na mitologia egípcia, deus dos mortos. Considerado o inventor do embalsamento, guardião dos túmulos e juiz dos mortos. Os egípcios acreditavam que no juízo das almas, ele avaliava o coração dos mortos com a pena da verdade. Na arte, era representado com cabeça de chacal. Às vezes, Anúbis era identificado como Hermes, da mitologia grega.
  
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Durante algum tempo, o Número 2 relata, cuidadosamente o desenrolar da missão sob sua responsabilidade. No final, o “Número 1” faz um agradecimento e um elogio. Logo em seguida, vários outros encapuzados fazem seus relatos. Cerca de meia hora depois, o Número 1 dá por encerrada a apresentação dos relatórios e apresenta uma nova pauta na reunião.
- Irmãos, hoje o irmão Número 7 receberá sua primeira missão. Como todos sabem, o ocupante do capuz número 7 morreu de forma trágica recentemente e de acordo com nossa Lei o herdeiro mais próximo deve ocupar o lugar do falecido. Ele já cumpriu e passou em todos os rituais de iniciação no mês passado, e hoje receberá sua primeira missão – O Número 1 aponta para o Número 7 e ordena – irmão, pode abrir o envelope.


O Número 7 apanha o envelope ao seu lado e abre. Enquanto examina a foto e as informações constantes num papel vermelho, ouve as palavras do Número 1:
- Você fará uma longa viagem ao Ocidente. Sua missão será realizada numa cidade chamada Porto Alegre, no Brasil. Nesse envelope está o rosto daquele que deve morrer.
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Porto Alegre, Brasil, duas semanas depois.
Jamal Kandahar, um jovem egípcio, professor de Arqueologia e História do Médio Oriente, está participando de uma conferência há dois dias. Há cientistas, professores, jornalistas e estudantes de várias partes do mundo. É uma conferência importantíssima sobre as mais recentes descobertas arqueológicas da Mesopotâmia e Egito. Um dos palestrantes é o famoso professor americano Victor Santinni, que reside há cinco anos no Brasil, e leciona História na mais tradicional Universidade de Porto Alegre.
Jamal estava tenso, muito tenso. Cuidadosamente, abriu sua maleta e ficou alguns segundos examinando a foto que levava consigo. Ele estava ali para matar Victor Santinni. Não sabia a razão, mas por algum motivo, o professor Santinni tinha ficado na mira da Ordem dos Escorpiões, uma sociedade tão secreta, que nenhum historiador ocidental jamais tinha ouvido falar. Essa sociedade possuía laços de união com outras sociedades secretas, mas era temida por todas as outras. Um dos seus objetivos era recuperar todos os tesouros egípcios saqueados por arqueólogos e caçadores ao longo dos séculos. Mas seu objetivo final era restaurar a milenar monarquia egípcia, e colocar o Egito novamente como o único Império da Terra. É claro que, para alcançar tais objetivos, os Escorpiões estavam dispostos a tudo. Qualquer historiador ou cientista que eles considerassem um empecilho, seria tirado do caminho. E sua forma de matar era inusitada: um escorpião venenoso!
Durante um intervalo, Jamal passeava pelos corredores da Universidade que estava sediando a conferência. Naquele momento, um grupo de estudantes discutia sobre os mistérios da mitologia egípcia, e um deles pronunciou a palavra “escorpião”. Foi como uma agulhada no peito de Jamal. Ele se aproximou, curioso e ficou atônito ao ver uma bela moça sorridente e de lindos olhos verdes e brilhantes, que parecia estar dominando a conversa.
- Sou fascinada pela cultura egípcia e meu grande sonho é visitar o Egito um dia. Tenho certeza de que em alguma biblioteca egípcia haverá algo sobre essa sociedade dos Escorpiões.
- Onde você leu sobre isso? – Perguntou um jovem ruivo, que estava na frente de Jamal.
- Quando estive nos Estados Unidos no ano passado, encontrei um professor de Egiptologia, que sabia muitas coisas. Enquanto pesquisava numa biblioteca americana, tive a oportunidade de me aproximar dele e fazer algumas perguntas. E foi assim, que, quase sussurrando, e olhando para todos os lados, desconfiado, ele me falou que um parente seu havia lhe contado sobre essa secretíssima sociedade de assassinos.
“Parece que não é mais tão secreta assim” Pensou Jamal, com os olhos fixos na moça, como se estivesse hipnotizado.
- Oi, você é egípcio? – Ela perguntou de repente, olhando para Jamal, que ainda mais atônito ficou, e tentou não tremer nas bases.
- Co - como disse?
- Se eu não me engano, sua fisionomia é de um egípcio bem natural – disse ela, aproximando-se. Muito prazer, eu sou Agnes Hannah.
- Você conhece bem os egípcios – disse Jamal, tentando controlar suas emoções e apertando a mão da moça – meu nome é Jamal Kandahar, professor de Arqueologia e História do Médio Oriente.
-Puxa vida! Quanta honra – disse a moça.
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Enquanto tomava banho, Jamal não conseguia pensar em outra coisa. Durante mais de uma hora, ele havia conversado com Agnes. Quanto mais conversava com ela, mais ficava fascinado. Era um sentimento estranho e muito bom. Seu coração batia de forma descontrolada. Nunca antes ele havia sentido tal coisa. Na verdade, tinha nascido e crescido em meio a tristeza e o ódio. Ainda criança viu sua mãe sendo morta acidentalmente quando tentava barrar o duelo de dois tios que se matavam com agudas espadas mortais. Cresceu vendo parentes sendo mortos a cada instante por causa de disputas religiosas, dentro do misticismo egípcio. Anos mais tarde, pouco depois de concluir seu curso universitário, testemunhou sua casa pegando fogo, matando seu pai e suas duas irmãs. Ao descobrir que seu pai fazia parte de uma sociedade secreta milenar, tentou seguir sua carreira, aceitando o convite da Ordem. Na verdade, ele pretendia se vingar de um tio, a quem culpava pelo incêndio e pela morte do pai. Mas, ao entrar na sociedade, teve que frear seus instintos, ou pelo menos adiar sua vingança, pois a Ordem não permitia vinganças pessoais.
Tudo que seu coração conhecia era ódio, desconfiança e vingança. Mas naquele dia, durante aquela conferência, uma reviravolta estava fazendo todo seu corpo tremer.
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É o quarto e último dia da conferência. Hoje ele deve executar sua missão. Há um grande conflito dentro de sua mente. O misterioso sentimento chamado amor havia invadido seu coração e ele só pensava em Agnes, que por sua vez também estava sentindo algo por aquele jovem egípcio. Mas ao mesmo tempo, uma força sinistra o impelia a cumprir a missão que o trouxera ao Brasil. Em seu quarto, ele abre uma maleta e apanha uma pequena garrafa de vidro. Olha bastante tempo para o pequeno escorpião preso. O que fazer agora? Não tinha tempo a perder. A sociedade não tolerava falhas ou hesitação.
Cheio de conflitos, Jamal consegue entrar no quarto do professor Santinni, enquanto este começava sua palestra. Calmamente, retira o escorpião da garrafa e o esconde dentro da mala do velho professor. Sai rapidamente do quarto e vai assistir o restante da palestra.
Procura Agnes com o olhar e sorri ao vê-la bem na frente, bastante atenta às palavras do professor. Tenta se aproximar dela, mas todas as cadeiras da frente já estavam ocupadas. Algum tempo depois, Victor Santinni pede desculpas aos conferencistas e, olhando para Agnes, faz um pedido:
- Filha, você poderia apanhar aquele documento sobre Hieróglifos que digitei ontem à noite? Infelizmente esqueci de trazê-los hoje. Está na minha maleta, no lugar de sempre.
Agnes se levanta, e Jamal tem um choque.
“Filha? Não é possível!” – Pensa ele, bastante atônito. Ele corre desesperado para impedir uma tragédia. Dentro do seu coração há um turbilhão de emoções, dominadas pelo desespero. Agnes estava muito mais próxima do quarto do que ele. Inocentemente, ela entra no quarto e abre a maleta do pai. Lá dentro, o pequeno assassino preparava seu aguilhão mortal.
*******
Jamal escancara a porta. Há um silêncio de morte dentro do quarto. Agnes Hannah está estendida no chão, enquanto o pequeno e diabólico escorpião passeia sobre seu braço direito, como se nada tivesse acontecido. Jamal joga-se ao chão, em prantos, desesperado.
*******

Abril de 1991, Igarapé Grande, Maranhão, Brasil, América do Sul, em pleno andamento do ano letivo...
Uma moça muito bonita interpelou um rapaz magro que vinha entrando apressado naquele Colégio de Ensino Médio.
- E ai, Morganne? Quais as novidades?
- Esse número na tua blusa.
A moça olhou para o número 22 estampado sobre o desenho de uma lua e sorriu.
- O que há de interessante nele?
- O número 22 me fez lembrar de John Kennedy, pois ele foi assassinado no dia 22 de novembro de 1963. Ele foi o 35.º presidente dos Estados Unidos, e esse número é o valor do nome do rei Davi, em nossa língua portuguesa. Davi viveu 70 anos e essa foi a duração do império comunista na antiga União Soviética.  Ela era formada por 15 repúblicas e isso me fez pensar no dia 15 de março do ano 44 antes de Cristo, quando Júlio César, primeiro imperador romano foi assassinado, com 23 punhaladas. 23 ao contrário é 32, que é o valor da palavra LUA, em nossa língua.
A moça olhou para o desenho da lua e sorriu.
- Puxa vida. Essa Ligação Lógica foi fogo.
- E você, Melissa? Tem estudado os arquivos?
- Na semana passada comecei a lição sobre códigos secretos. Falando nisso, quando haverá um treinamento daqueles?
- Vamos esperar as férias do meio do ano, tá bom? Eu estava pensando em... – o jovem olhou para um casal que ia passando e gritou – Scapelly! Brigitte! Façam favor.
O casal se aproximou e os quatro amigos conversaram durante uns 10 minutos, até que a campainha tocou e tiveram que entrar na sala de aula.
*******
A professora Sophie deu uma pausa na explicação da aula de Psicologia e aproximou-se de Morganne.
- Li aquele texto sobre a Filosofia 7 e achei muito interessante e também estranho. Gostaria que depois você me explicasse melhor o que significa.
Ela voltou a explicar as aulas e Morganne ficou pensativo.
*******
O quintal da casa de Scapelly era bem espaçoso e cheio de árvores frondosas. De vez em quando Morganne e seus amigos se reuniam lá para estudarem a Filosofia 7. Naquele sábado o dia estava muito lindo. Era o final de Abril, Maio estava se aproximando e com ele aquele clima de muito vento. Havia 12 jovens cercados de livros, pastas e muitos papéis. Estavam ali Morganne, Diego Draconne, Giovanna, Timonthy, Brigitte, Scapelly, Alain John, Melissa, John Mac Lonners, Magry, Vanessa e Sabrina.
Morganne estava em pé próximo a uma grande árvore e explicava o significado de certos códigos num cartaz.
- Não é fácil decifrar esta mensagem – dizia ele, em tom didático – Observe esta figura do lado direito. Ela mostra... Ei! O que é isso?
Uma flecha cravou-se a poucos metros de sua cabeça. Imediatamente, ele se jogou ao chão.
Os outros jovens ficaram sobressaltados e todos olharam na direção oposta à flecha fincada na árvore.
- Que negócio é esse? – Diego exclamou, juntamente com os outros.
Morganne, mostrando-se visivelmente abalado, levantou-se e arrancou a flecha, notando que amarrada à ela havia um pedaço de papel.
- Que maluquice é esta? – Disse, abrindo o papel.
“BOM DIA, SETES.
VOCÊS NÃO ESTÃO DE OLHO EM MIM, PORÉM EU ESTOU DE OLHO EM VOCÊS.
DIZEM QUE VOCÊS DECIFRAM TODOS OS ENIGMAS DO MUNDO. EU SOU UM ENIGMA DECIFREM-ME.
CORDIALMENTE,
ESCORPIÃO”.
- Escorpião? Ora, ora. Lá vem alguém tentando nos desafiar – disse Morganne.
- Alguém está levando o Grupo 7 muito a sério – disse Melissa.
- Quem será o engraçadinho? – Diego perguntou – quem quer que seja, é um excelente atirador de flechas. Se ele quisesse te acertar, meu caro, certamente o teria feito.
- Era só o que faltava – disse Alain John – O que será que está oculto nessa mensagem?
Naquele momento, os jovens SETES percebem um pedaço de papel muito pequeno colado no verso da mensagem. Morganne desdobra e lê em voz alta:
“ESTA É A 8.ª PALAVRA-CHAVE.
HELMUT KOHL - BENAZIR BHUTTO – LECH WALESA – MUAMMAR AL-KADAFI – ANWAR AL SADAT”.
 - 8.ª palavra-chave? – espantou-se Morganne – Quais as outras? Aqui temos cinco nomes estrangeiros, que não são desconhecidos para nós.
- Helmut Kohl é o atual Chefe de Governo da Alemanha – disse Magry, logo acrescentando – Benazir Butto é uma líder política no Paquistão (1.ª ministra até o ano passado); Lech Walesa é o presidente da Polônia; Muammar Al – Kadafi é o líder máximo da Líbia e Anwar Al  - Sadat foi presidente do Egito durante muitos anos até ser assassinado por membros das Forças Armadas egípcias no dia 06 de outubro de 1981, no Cairo.
- Puxa vida! Sua mente está em dia, hein? – Exclamou Diego.
- Que palavra chave está escondida aí? – Perguntou Sabrina.
- Destacando as letras iniciais dos nomes não faz sentido – disse Melissa – veja só: H – K – B – B – L – W – M – A –K – A – A – S.
- E se numerarmos essas letras? – sugeriu Lonners – H é 8, K é 11, B é 2...Não, não vejo significado nenhum – concluiu desanimado.
- Acho que antes de tudo devíamos examinar o local de onde foi disparada a flecha – Falou Magry, fazendo menção de sair.
Os 12 jovens seguiram na direção de onde fora disparada a flecha, na esperança de encontrarem alguma pista. O pior é que o quintal de Scapelly ficava do lado de um terreno desabitado, cheio de árvores, e próximo a um grande igarapé, que dava nome à cidade. Quem quer que fosse o “atirador de flechas” uma hora dessas já estava bem longe. Com certeza, ele já havia dado a volta e entrado na cidade.
*******
Seguindo em direção reta, cerca de 10 metros (distância calculada pelos jovens, como sendo a distância em que a flecha havia sido disparada), minutos depois eles chegaram a outra grande árvore.
- O atirador de flechas esteve aqui – disse Morganne, abaixando-se e examinando o terreno.
- Vocês procurem pistas por ai e procurem não se aproximar muito daqui para não apagar os rastros – disse Diego.
- Se bem que aqui não há rastro nenhum, a não ser o nosso – observou Sabrina.
E na verdade, não havia mesmo.
- Veja aqui – apontou Diego – nosso misterioso Escorpião usou um velho truque indígena para apagar rastros. Cortou alguns galhos daquela árvore ali e limpou o terreno até aquelas gramas.
- Olhem aqui – Magry apontou para o alto de uma árvore. Havia um pedaço de barbante cuja ponta estava queimada.
- O que isto significa? – Perguntou Morganne, examinando cuidadosamente o barbante queimado.
- Tenho certeza de que tem algo a ver com a flecha – disse Sabrina, procurando algo ao redor da árvore - Vocês observaram que há um rastro estranho atrás da árvore que segue até o igarapé?
Todos ficaram curiosos, e concordaram que havia uma marca (parecia um risco feito de pau ou pedra) que seguia da árvore até o igarapé, que ficava distante somente três metros.
- Bom, acho melhor nos concentramos na mensagem que ele enviou – disse Morganne
- Como responderemos ao desafio dele, Morganne? – Perguntou Sabrina.
- Não sei. Ele não deixou nenhum endereço. Com certeza deve seguir nossos passos de perto, e qualquer decisão nossa ele saberá.
- Talvez seja algum colega nosso – sugeriu Magry, pensando no Colégio.
- Eu não me admiraria se Vandevil estivesse envolvido outra vez nessa história – Disse Sabrina.
Vandevil era um jovem arrogante e cético que, vez por outra, desafiava o Grupo 7.  De vez em quando, na praça central, ele e alguns dos jovens “SETES” debatiam até altas horas da noite sobre os temas de pesquisas do Arquivo 7. Vandevil era muito inteligente, mas seus argumentos não duravam muito, visto que os SETES levavam uma vantagem muito grande sobre o jovem cético: Eles liam muito, enquanto que Vandevil tinha preguiça até mesmo em folhear um livro.
- Talvez – respondeu Morganne, olhando para Sabrina – talvez. Embora eu ache esse Escorpião muito mais sofisticado que Vandevil.
- Segunda feira eu olharei dentro dos olhos dele e verei se ele consegue me encarar – disse Magry.
- Vá com calma – advertiu Melissa – Não deixe que ele desconfie que suspeitamos dele.
*******
- E ai, tudo legal com vocês? – Perguntou a professora Sophie ao atravessar o corredor, durante um intervalo das aulas.
- Às sete mil maravilhas – respondeu Morganne, sorrindo. Ele estava ao lado de Magry e Sabrina.
- Essa professora é inteligente – disse Sabrina logo depois – O que ela achou da Filosofia 7?
- Disse que quer conhecer mais detalhes – Respondeu Morganne.
Naquele momento, a diretora Stefânia Seller passou por eles e Morganne ficou observando. Ela tinha uns quarenta anos, e ainda era solteira e muito atraente. Estava em Igarapé Grande há 10 anos. Bastante disposta e inteligente, comprou aquele colégio das mãos de Dona Wanda Amaral, que estava cansada e doente, e o ampliou ainda mais, tornando-o um dos colégios mais respeitados da região. Alguns anos depois, ela trouxe da cidade grande três professores brilhantes, que tornaram o Colégio ainda mais requisitado.
- Já pensou se o Escorpião fosse Dona Stefânia? – Sugeriu Magry, sorrindo, como que a adivinhar o pensamento de Morganne.
- Só se fosse num romance policial. Você encarou Vandevil?
- Não deu tempo. Ele está muito ocupado com aquele trabalho de matemática. Eu só... Ei! A dona Stefânia  está chamando um de nós. Parece que é você – disse, olhando para Morganne.
*******
- O que é, Dona Stefânia ?
- Um menino acabou de deixar isso aqui na secretaria.
- Ao pegar o envelope, Morganne correu até o portão do colégio, olhando em todas as direções.
- Nossa! – Exclamou, ao abrir o envelope (um envelope branco, comum) – correspondência do Escorpião.
- Eu quero ver também – disse Magry, aproximando-se o rosto do de Morganne.
- Não me deixem de fora – disse Sabrina, procurando entrar entre os dois.
A mensagem, datilografada, dizia o seguinte:
“TODAS AS PALAVRAS-CHAVE REUNIDAS PRODUZIRÃO A CHAVE DO ENIGMA. O CALOR COSTUMA REVELAR SEGREDOS”.
- O calor costuma revelar segredos – repetiu Morganne, pausadamente – o que essas palavras querem dizer?
- Calor que revela segredos? – Perguntou Sabrina – acho que sei o que é. Lembram-se do código tinta fantasma?
- Tinta fantasma? – espantou-se Morganne, logo acrescentando – é mesmo! Esse cara conhece até o segredo da tinta invisível?
- Vamos procurar uma lâmpada – sugeriu Magry.
Minutos depois, Morganne aproximou o papel de uma lâmpada e deixou que esquentasse durante alguns minutos. Logo, como num passe de mágica, algumas letras começaram a aparecer no papel. Há muito tempo que os SETES conheciam esse truque. Nesse sistema eles escreviam as mensagens com suco de limão, laranja, ou simplesmente água com açúcar. Depois deixavam secar ao sol. Minutos depois, a mensagem ficava invisível. Para que ela voltasse a ficar visível e legível, era só esquentar perto de alguma lâmpada ou mesmo do fogo. Outro processo (embora mais fraco) consistia em se escrever com a ponta de alguma vela sobre uma superfície branca, de forma bem leve. Depois, era só mergulhar o papel na água, que a mensagem iria aparecer de forma fantasmagórica.
A nova mensagem secreta enviada pelo Escorpião dizia:
“A 7.ª PALAVRA CHAVE ESTÁ AQUI: 149 – 197 – 859 – 357”.
- O que esses números querem dizer? – Perguntou Magry.
- Se juntarmos assim, talvez diga alguma coisa – disse Sabrina, anotando no caderno a seqüência:
14 – 9 – 19 – 7 – 8 – 5 – 9 – 3 – 5 – 7.
- Por que você separou os algarismos dessa forma? – Indagou Morganne.
- A principio pensei que tivesse algo a ver com as letras do alfabeto, mas vejo que estou errada. Essa seqüência geraria as letras O, I, T, G, H, E, I, C,E, G. Não faz sentido.
- Se bem que essas três letras aqui formam uma palavra em inglês – disse Magry, apontando para as letras I, C, E – a palavra é ICE, ou seja, GELO.
- Talvez você esteja certa, mas acho pouco provável. Acho que esse quarteto de números deve ter outro significado – disse Morganne.
- Por que não vamos até dona Stefânia  saber mais sobre o rapaz que trouxe a mensagem?
A sugestão de Sabrina foi aceita e partiram de imediato. Naquele momento, Diego Draconne chegou, perguntando:
- Alguma novidade sobre o Escorpião?
*******
- A senhora conhece o menino que veio aqui ontem?
- Acho que já o vi por aí, mas não sei o nome dele.
Morganne estava na secretaria do colégio. Ao seu lado estava Diego Draconne.
- Alguém mais estava aqui, quando o menino entrou?
- Só eu e a Natália – disse, apontando para a secretária.
- E você, Natália? – Morganne virou-se para ela, uma mocinha gorda e sorridente.
- Eu também digo que nem a Dona Stefânia . Já vi esse menino por ai, mas quanto a conhecê-lo, não sei.
- Como ele se vestia? Segurava algum objeto quando entrou aqui, qualquer coisa, sei lá...
- Olha, na hora que ele chegou, eu estava atendendo o professor Pike e não pude prestar mais atenção.
- Tá, de qualquer forma, obrigado. Tenho que ir.
Enquanto seguia para a classe, Morganne estava pensativo.
- Não acho tão difícil assim desmascarar esse Escorpião – disse Diego, quebrando o silêncio – Se ele está usando máquina de datilografia, facilita as coisas pra nós, pois pelo que eu saiba, aqui em Igarapé Grande só deve ter umas 15 ou menos. Temos na Prefeitura, Banco do Brasil, Delegacia, alguns colégios, escritórios da Cemar, Caema, etc.
- É, pode dar trabalho, mas não será impossível. Venha. A aula começou.
*******
O professor Albert Pike estava na sala e iria começar mais uma aula de História. Sabrina olhava para ele de maneira anormal. Parecia sondá-lo. Sim, era isso mesmo. Ela o estudava detalhadamente. Lembrava que no ano passado, Pike tinha se desentendido com Morganne, por causa de certas teorias relacionadas ao Arquivo 7. Ele não era inimigo do Grupo 7 como Vandevil, mas gostava de mostrar que sabia das coisas. Até aí nada demais. O problema é que ele achava que sabia das coisas mais do que todos os outros. Era um homem muito misterioso. Foi um dos três professores que Dona Stefânia trouxera da capital.
“Ele é um ótimo candidato para ser o Escorpião” Pensou Sabrina.
*******
Praça Central da cidade, minutos depois de sair do Colégio do Ensino Médio, Morganne apresenta a seus amigos uma nova brincadeira, que ele denominou de MATEMÁGICA BÍBLICA.
- Que negócio é esse? – Perguntou a professora Sophie, aproximando-se.
Ele ficou um pouco nervoso, mas controlou-se logo depois, passando a explicar:
- A palavra Matemágica, como podem perceber, é a mistura de matemática com mágica. Sabemos que os números são cheios de mistérios e se prestam a muitas artimanhas e truques. O que eu descobri pesquisando a Bíblia é que aparecem nela muitos números em certas situações que chegam a ser significativas. Encontrei também algumas coincidências exclusivas em nossa língua portuguesa, que chegam a ser surpreendentes.
- Faça uma demonstração para ficar mais claro – pediu Sophie, ao mesmo tempo em que foi aumentando o número de curiosos, interessados nos truques numéricos de Morganne.
- Como encontrar na Bíblia a palavra PÉ? – Perguntou Morganne, logo se apressando em responder – Há um número que tem muita afinidade com a palavra PÉ, o número 5. Por que? Ora, um pé normal tem 5 dedos. A palavra PÉ tem o valor numérico de 20, que é 4 x 5.
- Valor numérico? Como assim? – Perguntou Sophie.
- As letras do nosso alfabeto não possuem uma ordem invariável? A letra A sempre vale 1, por ser a primeira, B, a segunda, C, a terceira, e assim por diante.
- Sim, claro – concordou Sophie, dando um passo à frente – continue.
Quando ia dar continuidade, Morganne percebeu alguém observando tudo à distância, próximo a uma grande árvore, o professor Albert Pike.
- Continuando, a palavra PÉ tem o valor de 20, que é 4 x 5, e o interessante é que a letra P vale 15 (que é 3 x 5) e a letra E é exatamente a 5.ª do alfabeto. Vejam quantos 5 aparecem ligado à palavra PÉ – enquanto falava, Morganne escrevia no chão, com giz – se o valor da palavra PÉ é 20, isso nos leva a pensar no 20.º livro da Bíblia, que é o livro de Provérbios (escrito por Salomão), e exatamente no capítulo 5 e versículo também 5, diz que os PÉS da adúltera conduzem o homem à morte. Outro exemplo: Há somente 5 livros no Antigo Testamento que começam com a 5.ª letra do alfabeto, que são: Êxodo, Ester, Ezequiel, Eclesiastes e Esdras. Colocando-os na ordem alfabética, Eclesiastes é o primeiro. E exatamente em Eclesiastes no inicio do capítulo 5 está escrito: “GUARDA O TEU PÉ QUANDO ENTRARES NA CASA DO TEU DEUS”.
- Interessante – Disse Sophie, lentamente – continue.
Morganne sorriu satisfeito e continuou:
- E, para concluir, exatamente no 5.º livro da Bíblia (Deuteronômio), capítulo 5 e versículo 5 está escrito: “NAQUELE TEMPO EU ESTAVA EM PÉ ENTRE O SENHOR E VÓS”.
- Bravo! – Exclamou Diego Draconne, que vinha chegando.
- Meus amigos, isto é o que chamamos de Matemágica Bíblica – explicou Morganne, logo acrescentando – Vejamos mais um exemplo. – Mentalmente, ele disse: “pra invocar vocês.”
Ele desenhou rapidamente um sol e uma lua.
- Como encontrar na Bíblia a palavra sol, usando a Matemágica Bíblica? O valor da palavra SOL é 43, ou seja, somando a letra S (número de ordem, 18) + a letra O (número 14) + a letra L (número 11), temos 43. O que faremos com esse número? Usando as duas operações positivas (adição e multiplicação), teremos dois resultados:
4 + 3 = 7 e 4 x 3 = 12. Somando os dois resultados (7 + 12), teremos 19. O 19.º livro da Bíblia é o livro dos Salmos. Usando os mesmos resultados (7 e 12), iremos agora usar a segunda operação (7 x 12) que é igual a 84. Vamos até o Salmo 84. – olhou para John Mac Lonners que estava perto e pediu – John, pegue aí sua pequena Bíblia. – Alguns segundos depois – John, a palavra SOL aparece no Salmo 84?
- Sim, está escrito: O Senhor Deus é Sol e escudo.
- Vocês não têm o que fazer, SETES? – Todos se voltaram ao som da voz que falara por último. Aquela maneira arrogante de falar só podia ser de Sanderville, o irmão de Diego Draconne, que, como Vandevil, também não simpatizava com o Grupo 7.
Ele se aproximou, sorrindo, e falou:
- Não pensei que os SETES tivessem a imaginação tão fértil.
- Você tem algum desafio novo, Sanderville? – Perguntou Morganne, afastando-se um pouco do centro e olhando diretamente nos olhos do rapaz recém chegado.
Sanderville era o irmão mais novo de Diego Draconne, e embora este fosse um dos mais ativos pesquisadores do Arquivo 7 e Cristão, aquele era ateu declarado e gostava de zombar dos SETES. Ainda assim, o maior inimigo do Grupo 7 naquela cidade não era Sanderville e sim Vandevil, que além de ser mais velho que o irmão de Diego, era mais inteligente e mais astucioso.
- Bom, tenho 7 enigmas pra vocês – disse Sanderville, sorrindo – o primeiro é:
“EM QUE LUGAR DO MUNDO AMANHÃ VEM ANTES DE HOJE, E HOJE VEM ANTES DE ONTEM?”
Um clima de silêncio e tensão começou a reinar.
- Enigma número 2 – continuou Sanderville, muito contente pelo número de pessoas que estavam atentas – prestem atenção:
“QUAL É O TRABALHADOR QUE PENSA PRIMEIRO NO INDIVÍDUO E SÓ DEPOIS NA SOCIEDADE; COLOCA O HOMEM SEMPRE ANTES DA MULHER; PÕE A GANÂNCIA À FRENTE DA SOLIDARIEDADE; FAZ QUESTÃO DE DIVULGAR CRIME, LIBERTINAGEM, PRECONCEITO, RACISMO E TORTURA; E, AINDA ASSIM, É RESPEITADO NO MERCADO DE TRABALHO?”
A platéia estava muito atenta e curiosa, enquanto os SETES olhavam para Sanderville, quase sem piscar.
- Enigma número 3 – Ele estava feliz em ver que ninguém sabia das respostas (ou pelo menos era o que parecia) – observem:
“O QUE É QUE O HOMEM AMA MAIS QUE A VIDA E TEME MAIS QUE A MORTE; É MAIS PODEROSO QUE DEUS E MAIS PERVERSO QUE O DIABO; OS POBRES TÊM, E OS RICOS PRECISAM; O GASTADOR ECONOMIZA, E O AVARENTO PARTILHA. ALIMENTA OS MORTOS, MAS SE OS VIVOS COMEREM, MORRERÃO LENTAMENTE?”
- Enigma número 4:
“DOIS TIMES DE FUTEBOL DISPUTARAM UMA PARTIDA. UM TIME GANHOU DO OUTRO POR 3 A 0, MAS OS GOLS NÃO FORAM MARCADOS POR NENHUM JOGADOR. COMO ISSO FOI POSSÍVEL?”
- Enigma número 5 – ele se abaixou e escreveu no chão:
101ne1000a
511000ona500a
Depois, perguntou:
- Que palavra está oculta nessas duas escritas?
- Enigma número 6 – Ele desenhou a seguinte figura no chão, desafiando – Alguém é capaz de fazer isto sem levantar o giz e sem voltar sobre a linha já feita?
“Esse bem que pode ser o Escorpião” pensou Sabrina, observando Sanderville de alto a baixo. O rapaz, que não era nem um pouco ingênuo, percebeu o olhar perscrutador de Sabrina, mas disfarçou, ou melhor, tentou disfarçar, pois Sabrina (uma das garotas mais espertas do Grupo 7) também percebeu a manobra dele.
- E então, espertos SETES? Ninguém conhece esses enigmas?
- Você não disse que eram sete? – Perguntou Morganne.
- Ah, calma. O sétimo é especial. Se vocês não são capazes de responder aos seis primeiros, não perderei tempo, citando o sétimo.
- Pois bem – disse Morganne, dando um passo a frente – o jogo começou!
Aquela expressão era uma espécie de senha. Um a um, vários dos SETES ali presentes, deram um passo à frente, respondendo ao desafio de Sanderville.

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